Lucia Murat celebra nova mostra de “cinema de resistência” no CCBB 6x4s4u
Cineasta terá trabalhos mais célebres exibidos no Rio de Janeiro e em São Paulo 5348o

Diretora latina que mais lançou filmes durante sua carreira, Lucia Murat, de 76 anos, lança nesta quarta-feira, 28 de maio, a mostra gratuita Cinema de Resistência: Um Olhar Sobre um Brasil Invisível no CCBB Rio (Centro Cultura do Banco do Brasil), que exibirá 34 obras célebres da cineasta sobre ditadura, feminismo, desigualdade social e povos originários. A mostra acaba em 23 de junho e depois segue para São Paulo.
Presa e torturada na ditadura, Lucia abordou sua própria história de resistência aos militares no filme Que Bom Te Ver Viva (1989), estrelado por Irene Ravache, e em outros longas. A mostra contará com 13 longas-metragens, 2 filmes de média e curta-metragem, além de 19 episódios em vídeo, organizados em quatro módulos temáticos: Ditadura e Memória, Povos Originários, Questões Femininas e Desigualdades. A programação será acompanhada por debates com artistas, ativistas e intelectuais, ampliando o diálogo proposto pelos filmes.
Em entrevista a VEJA, a carioca celebra a mostra de cinema e fala da ditadura, a representação feminina no audiovisual e mais. Confira a conversa na íntegra:
Por que é tão importante continuar fazendo filmes sobre esse período tão sombrio da história brasileira que foi a ditadura militar? Acho que violência e desigualdade são temas que estão presentes em muitos dos meus filmes. Quer dizer, com variações importantes. Os filmes sobre a ditadura representam não somente aquela época, mas um tempo que ainda vivendo. Por exemplo, Que Bom Te Ver Viva é claramente um filme que tem a questão da tortura, da violência. Já O Mensageiro (2023) reflete muito a polarização que estamos vivendo. Discutir a existência da humanidade em meio ao horror, sem julgamentos, é importante. Cada um deses filmes me representa de alguma forma. Até porque eu nunca fiz filme por encomenda, todos os meus longas partiram de necessidades minhas.
Lá atrás, no começo da sua carreira, quando decidiu transformar suas experiências traumáticas em arte? Eu acho que não foi uma decisão, foi um processo. Aconteceu por causa da minha relação com o cinema. Meu primeiro filme mesmo foi O Pequeno Exército Louco (1984), um documentário assinado por mim e pelo Paulo Adário sobre a guerra civil na Nicarágua. Eu não fazia cinema, o Paulo fazia, eu fazia jornalismo, que na época, era muito próximo do cinema por causa do Globo Repórter. E eu me senti atraída por esse universo cinematográfico. Hoje, olhando para trás, acho que o que me levou a fazer aquele filme na Nicarágua foi uma busca minha por contar histórias da minha geração na América Latina. amos sufoco para aprovar o roteiro com a Embrafilme [empresa estatal que produzia e distribuía filmes nacionais naquela época], e depois de ser aprovado foi suspenso porque estavam boicotando filmes políticos. Nesse processo, acho que me apaixonei pelo cinema com essa possibilidade de levantar questões.
Dos filmes que vão ar na mostra, apontaria algum que foi muito marcante para a senhora? Eu brinco sempre quando me perguntam isso, eu falo assim: “Sempre é o último, né?”. Quero mesmo é continuar. Dividimos a mostra em em quatro módulos: Memória, povos originários, questões femininas e desigualdades. Acho que sou muito marcada pela questão da ditadura, e o Que Bom Te Ver Viva acabou virando o meu clássico — por mais que eu não goste dessa palavra. É um filme considerado muito importante, foi um dos meus primeiros filmes que trata da tortura e é marcante por isso e por ter perdurado com o tempo. Às vezes as pessoas dizem: “Ah, mas você não tem filmes que explodiram de público, né?”, mas o que eu respondo, principalmente para patrocinadores, é que, por outro lado, muitas pessoas ainda querem ver os filmes que fiz. Até hoje eles são distribuídos pelo Brasil, Portugal e Estados Unidos. A curadora da mostra, a Denise Lopes, que deu a ideia de colocar “o Brasil invisível” no título, porque minhas obras dão vozes a quem não é ouvido muitas vezes.
A senhora é uma das poucas cineastas brasileiras que realmente se destacam no mercado ainda tão masculino. Acha que ainda falta espaço para as mulheres, esse cenário melhorou de quando começou pelo menos? Acho que existe uma diferença absurda hoje. Quando eu fiz Que Bom Te Ver Viva, por exemplo, a equipe era inteiramente masculina, eu tinha que falar grosso para ser ouvida. É óbvio também tinham um pouco de medo de mim, por ter aquela fama de presa política, então eu me agarrava nisso. Quando eu fui fazer o Praça Paris (2018), até a entrada de alguns co-produtores, só tinha mulher na chefia do departamento — algo inimaginável no ado. Esses tempos vi uma chefe de elétrica mulher, isso é incrível. O ponto de vista feminino, porém, ainda é pequeno. Hoje devemos ter em torno de uns 20% de mulheres diretoras, o que ainda é pequeno, mas assim, não se pode comparar com quando eu comecei.
Quais são seus próximos projetos? Tenho um projeto para televisão, do Canal Curta, um documentário sobre o que aconteceu 20 anos depois do filme Maré, Nossa História de Amor (2007). Sobre o que aconteceu com alguns personagens. Tem uns personagens maravilhosos, selecionamos alguns e fomos atrás deles. E tenho um road movie que ainda está em produção.
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