Chef e escritor, Yotam Ottolenghi discute comida afetiva em novo livro 581l32
Em entrevista exclusiva, o autor fala de seu novo livro, 'Nostalgia', em que discute os diferentes significados para a comida reconfortante 1n4nm

Desde 2008, quando publicou seu primeiro livro de receitas, o chef israelense-americano Yotam Ottolenghi se tornou um dos maiores autores do gênero. Livros como Jerusalém, de 2012, e Comida de Verdade, de 2016, tornaram-se best-sellers no Brasil e no mundo e consolidaram seu nome como um divulgador da boa comida e defensor do ato de cozinhar.
Em seu novo livro, Nostalgia, publicado pela Companhia de Mesa, Ottolenghi e seus três coautores, Helen Goh, Verena Lohmuller e Tara Wingley, se debruçam sobre a comida afetiva, reconfortante e tradicional. Embora a chamada “comfort food” tenha diferentes significados para cada pessoa, de acordo com sua origem, há muitos elementos em comum. E compartilhar essas receitas é uma forma de criar conexões entre as pessoas.
Com a palavra, Ottolenghi.
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Como surgiu a ideia de escrever um livro sobre comfort food?
Tudo começou quando eu e Helen, uma das coautoras, estávamos viajando para promover nosso livro anterior, Sweet. Durante a turnê, sentíamos muita falta da comida de casa. Conversamos sobre o que gostaríamos de cozinhar no dia a dia. Depois, trouxemos mais dois autores para o grupo, e percebemos que cada um nós tem seu próprio conjunto de memórias e ideias. Não se trata tanto de casa, mas sim de algo mais geral, mais profundo. E daí surgiu a ideia de um livro sobre comidas que trazem conforto, com um elemento emocional forte — muitas vezes nostálgico.
O que exatamente vocês consideram como comfort food?
É uma definição difícil porque varia muito de pessoa para pessoa. Mas percebemos que há elementos em comum: carboidratos como arroz, batata, macarrão, pratos com frango, ensopados e frituras. Organizamos o livro em capítulos temáticos para refletir essas categorias comuns.
Qual é o papel da comida na conexão entre culturas e origens?
A comida é uma linguagem universal. Desde bebês, nos comunicamos por meio do paladar — aceitando ou rejeitando alimentos. Ao viajar ou conhecer outras culturas, a comida serve como ponte, conectando pessoas. Quando cozinho algo da minha infância e sirvo a outra pessoa, muitas vezes isso também desperta memórias nela, mesmo que seja de uma origem diferente.
Como foi o processo de seleção das receitas, já que o livro tem quatro autores?
Tivemos muitos encontros para testar receitas. A Verena coordenava os testes na minha cozinha em Londres. Cada um trazia suas ideias e discutíamos. Nem sempre concordávamos. Por exemplo, questionei se beterraba podia ser comfort food, mas ao provar a receita lenta e saborosa de beterraba da Helen, mudei de ideia.
Como evitar a apropriação cultural ao explorar receitas de outras culturas?
É uma linha tênue. Não podemos perder a liberdade criativa, mas precisamos ser conscientes. Por exemplo, sinto-me mais à vontade para brincar com receitas italianas, pois são amplamente conhecidas. Mas ao tratar de culinárias menos representadas, é essencial contextualizar e respeitar. Sempre explico qual é a receita original e qual foi minha adaptação.
Qual o papel dos livros de receita no mundo digital, dominado por redes sociais como o TikTok?
Apesar de vivermos cercados por receitas online e até por IA, os livros continuam fortes. Eles oferecem contexto, história, personalidade. Um livro de receitas é como cozinhar ao lado do autor. É uma janela para o mundo daquela pessoa — algo que uma receita avulsa online não proporciona.
Você acha que as pessoas estão desconectadas da comida real e dos ingredientes?
Sim, totalmente. Cozinhar nos conecta com nossos ancestrais. É uma atividade humana fundamental. Hoje, tudo é tão rápido e digital que cozinhar algo simples com as próprias mãos se torna um ato quase transcendental. Sempre incentivo as pessoas a cozinharem, mesmo algo simples — isso é terapêutico e profundo.
É possível ser curioso, disposto a provar diferentes sabores, e ainda sentir falta dos sabores de casa?
Com certeza. Mesmo gostando de experimentar novos sabores, sempre sentimos falta dos sabores da infância. Não é contraditório — é natural. Nossa base alimentar emocional é formada nos primeiros anos de vida. Experimentamos, mas buscamos o conforto daquilo que conhecemos.
Você já disse que gosta de “drama” no prato. Isso se aplica à comfort food?
Gosto de sabores intensos, mas quando chego em casa depois de um dia de testes, tudo que quero é arroz com manteiga, sal e pimenta. A comfort food nem sempre precisa de drama — ela oferece tranquilidade. Mas às vezes dá para dar um toque especial. No livro, tem um arroz assado com bolinhas de queijo derretido no meio — simples, mas com uma surpresa deliciosa.
Existe um prato que representa conforto absoluto para você?
As almôndegas com limão, batata e aipo me remetem imediatamente à minha infância em Jerusalém. Também o homus. Quando mais jovem, era rígido quanto à receita tradicional. Hoje, aprecio variações, como uma com toques ses. O que importa é a textura, o sabor, o conforto que ela proporciona.