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Alexandre Schwartsman

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Economista, ex-diretor do Banco Central

Fábula real

A gestão de Lula cogitou matar a galinha dos ovos de ouro

Por Alexandre Schwartsman Atualizado em 7 mar 2025, 16h02 - Publicado em 7 mar 2025, 06h00

Não prosperou a ideia de restringir as exportações de alimentos graças à reação do ministro da Agricultura, Carlos Fávaro. Ele ameaçou se demitir caso o governo levasse adiante a proposta para supostamente conter a alta de preços, que corrói a aprovação do presidente Lula.

Aos olhos desesperados de quem vê sua popularidade minguar, a coisa até aparenta fazer sentido. Exporte menos, sobra aqui, preços caem e, portanto, a reeleição fica menos difícil. O que poderia dar errado? O raciocínio ignora não se tratar de jogo disputado uma única vez, mas ao longo de várias rodadas. Se alguém expropria (pois é disso que se fala) o produtor agrícola, não há muito que ele possa fazer hoje, mas, como se diz, “cachorro mordido por cobra tem medo de linguiça”.

A partir do momento em que fica claro que as regras podem mudar com a bola rolando, não há como esperar que o comportamento dos jogadores seja o mesmo. Ao levar em conta a probabilidade de que possa ser expropriado novamente, o produtor reduzirá os investimentos e, portanto, a produção. Afinal de contas, quem gosta de (literalmente) não colher o que plantou?

As consequências seriam graves. Em 2024 o setor agrícola exportou 73 bilhões de dólares, cerca de 21% do total do país, e gerou saldo comercial de 67 bilhões de dólares, equivalente a quase 90% do superávit brasileiro. Pudemos importar bens industriais e manter, durante boa parte do ano, seus preços correndo abaixo do IPCA graças à agricultura.

“Se o governo estivesse realmente preocupado com a inflação, teria que adotar medidas de alcance maior”

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Nos últimos 13 anos, período em que o crescimento do produto por trabalhador no Brasil ficou praticamente estagnado, senão em queda, a produtividade do setor cresceu a pouco menos de 6% ao ano. Se os demais setores apresentassem metade do desempenho da agricultura nesse intervalo, não apenas o PIB seria muito mais alto como provavelmente não observaríamos boa parte das tensões inflacionárias que hoje forçam o BC a elevar rapidamente as taxas de juros.

Tivesse, pois, o plano infalível (no sentido Cebolinha do termo) sido posto em prática, não há dúvida de que nosso futuro seria bem diferente do ado e certamente não para melhor. Equivaleria a matar a proverbial galinha dos ovos de ouro.

Por mais que preços de alimentos tenham dinâmica por vezes própria, é fato que: (a) boa parte do seu movimento recente não decorre de súbita contração da oferta, mas do encarecimento do dólar, resultado dos equívocos de gestão da política macroeconômica, notadamente as contas públicas; e (b) o comportamento ruim da inflação tem raízes mais profundas do que a alta desses preços, também consequências de uma política macroeconômica muito ruim.

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É politicamente confortável atacar os sintomas (e não a causa) da inflação, assim como singularizar um grupo de agentes (no caso, produtores agrícolas) como responsáveis pelo problema; isso, porém, não interrompe a alta de preços, pelo contrário.

Se o governo estivesse de fato preocupado com a inflação — e não apenas com suas repercussões políticas —, teria que adotar medidas de alcance maior do que restrições às exportações. Como não o faz, a conclusão inescapável é que não sabe o que fazer, ou pior, sabe, mas prefere não fazê-lo porque ameaçaria seus planos eleitorais de curto prazo.

Para o governo Lula, matar a galinha pode fazer muito mais sentido.

Publicado em VEJA de 7 de março de 2025, edição nº 2934

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