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Como o Smart Sampa tirou quase 2.200 criminosos das ruas em seis meses 3l3t4u

Programa aposta em monitoramento por câmeras, reconhecimento facial e uso de bancos de dados da polícia 394b6l

Por Laísa Dall'Agnol Materia seguir SEGUIR Materia seguir SEGUINDO Atualizado em 24 jan 2025, 11h15 - Publicado em 24 jan 2025, 06h00

Um homem de 73 anos pedala tranquilamente por uma rua da região da 25 de Março, no centro de São Paulo, quando de repente é abordado por uma equipe da Guarda Civil Metropolitana e encaminhado a uma delegacia. Algo parecido acontece com outro suspeito, de 30 anos, que a por terminal de ônibus da Zona Leste e com uma mulher de 52 anos que busca atendimento em uma Unidade Básica de Saúde — ambos acabam sendo algemados e levados a uma unidade policial. Os casos são resultados da nova tentativa do poder público de combater o crime: o uso de câmeras equipadas com tecnologia de reconhecimento facial e o cruzamento das imagens com bancos de dados da polícia. Nesses exemplos, os detidos eram procurados pelos crimes de estupro, tráfico de drogas e estelionato, respectivamente.

Carta ao Leitor: O Brasil precisa discutir com maior seriedade e profundidade os desafios da área de segurança

As prisões se deram graças ao programa Smart Sampa, da prefeitura de São Paulo, a mais ampla e bem-sucedida iniciativa desse tipo no país. Apenas nos últimos seis meses, 456 foragidos da Justiça foram capturados e 1 712 criminosos presos em flagrante por delitos como furto, roubo e tráfico, além da localização de trinta pessoas desaparecidas (veja quadro). De acordo com a prefeitura, o programa, implementado em julho do ano ado, foi um dos fatores responsáveis pela redução de crimes entre 2023 e 2024. No período, houve queda de 17,3% nos furtos e de 27,7% nos roubos no centro da cidade, região com a maior concentração de câmeras equipadas com a tecnologia. Os resultados, é verdade, também são reflexo de outras iniciativas conjugadas, como o aumento do efetivo nas ruas, mas a prefeitura já comemora. “Entre as grandes cidades do mundo, nenhuma conseguiu reduzir os índices de criminalidade sem acoplar tecnologia ao processo”, diz o prefeito Ricardo Nunes (MDB). “Com as ações do Smart Sampa, com as intervenções da GCM e do governo do Estado, por meio das polícias, estamos tendo resultados muito positivos. O uso da tecnologia é um caminho sem volta”, afirma.

arte smart sampa

O esquema de monitoramento não tem comparação com o de nenhuma cidade brasileira. São 23 000 câmeras com a tecnologia de reconhecimento facial, sendo 20 000 equipamentos da prefeitura e o restante do setor privado, como condomínios e estabelecimentos, que compartilham as imagens com a gestão municipal. Na central de gerenciamento, painéis exibem as transmissões em tempo real e 24 horas por dia, sete dias por semana. No local, dividem-se em turnos profissionais da GCM e de órgãos municipais como a Defesa Civil. Quando uma pessoa foragida a por uma das câmeras, é emitido um alerta e as viaturas são acionadas — a posição de cada veículo é georreferenciada.

Com base no bom desempenho inicial, a prefeitura já planeja a expansão do sistema. O primeiro o é ampliar as bases de dados para, assim, aumentar a eficiência das operações. Em janeiro, foi assinado um convênio com o Ministério da Justiça, do governo federal, para que o município e a ar o Córtex, plataforma que reúne dados sobre veículos roubados e furtados. O Smart Sampa tem 4 000 câmeras já em funcionamento com a tecnologia de leitura de placas. A expectativa é que o programa cresça em fases — ampliação de bases de dados e integração com outras plataformas são duas delas. Uma outra, em estudo, é uma parceria com o governo estadual, comandado pelo aliado Tarcísio de Freitas (Republicanos), para monitorar criminosos com tornozeleira eletrônica e que não podem ficar na rua após as 22 horas. Outra parceria avaliada com o estado é no caso de mulheres vítimas de violência e com medida protetiva: caso o agressor se aproxime da casa de uma delas, um alerta seria emitido. “Hoje, o sistema tem 25% de utilização do seu potencial. São várias etapas. Apenas nas câmeras com reconhecimento facial, a expectativa é que cheguemos a 30 000 até o final do ano”, afirma o secretário de Segurança Urbana, Orlando Morando.

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DE OLHO NO FUTURO - O prefeito Ricardo Nunes: celebração dos primeiros resultados e planos para expandir o sistema
DE OLHO NO FUTURO - O prefeito Ricardo Nunes: celebração dos primeiros resultados e planos para expandir o sistema (Claudio Gatti/VEJA)

A questão da segurança pública, embora seja tradicionalmente uma atribuição dos estados, tem ganhado cada vez mais espaço na agenda dos municípios. A tendência foi amplamente notada na última eleição municipal, quando o tema foi unanimidade nas plataformas eleitorais, da direita à esquerda. E não é para menos. Pesquisas mostram que a segurança tem tirado o sono dos brasileiros: levantamento Genial/Quaest do final de 2024 apontou que a preocupação com a violência desbancou áreas tradicionais como saúde e educação e já é o assunto que mais inquieta a população em sete das dez capitais mais populosas do país, incluindo São Paulo.

O exemplo dado pela maior metrópole do país do uso intensivo de câmeras de monitoramento é o mais vistoso, mas outros municípios e estados também têm adotado, à sua maneira, programas que aliam a tecnologia ao combate à criminalidade. No Rio de Janeiro, o Civitas (Central de Inteligência, Vigilância e Tecnologia em Apoio à Segurança), implantado em junho de 2024, tem hoje 3 800 equipamentos com inteligência artificial e reconhecimento facial, número que o prefeito Eduardo Paes (PSD) pretende quintuplicar. Diferentemente de São Paulo, na capital fluminense não há a interação desse sistema com a Guarda Municipal — um dos objetivos no projeto de expansão é intensificar a interlocução com a força policial. Por enquanto, também não há o compartilhamento de imagens de sistemas privados. O Civitas já foi acionado quase 1 000 vezes para ajudar em investigações. Outro caso de sucesso, já considerado referência nos estados, é o do Espírito Santo: o programa Cerco Inteligente, lançado em 2022, interligou 1 650 câmeras de diversos órgãos públicos em 290 pontos do estado. Em setembro do ano ado, o sistema ganhou a tecnologia de reconhecimento facial por meio de um projeto-piloto. O estado, que era o segundo mais violento do país em 2011, agora ocupa a 18ª posição no ranking.

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MAIS VIGIADA - Rio de Janeiro: a cidade quer quintuplicar o número de câmeras
MAIS VIGIADA - Rio de Janeiro: a cidade quer quintuplicar o número de câmeras (Guito Moreto/Agência O Globo/.)

O investimento em tecnologia e inteligência pode ser um caminho promissor em um país que tem naufragado na tentativa de ser mais civilizado e efetivo no combate ao crime. Um dos caminhos adotados com facilidade é o da intensificação do uso da força policial na repressão. Embora algumas circunstâncias justifiquem os confrontos, sobretudo diante da expansão e da audácia do crime organizado, o fato é que as políticas de linha dura, por si só, não têm sido suficientes. Um dos efeitos colaterais óbvios é o crescimento da letalidade policial, que subiu em dez estados no ano ado, com São Paulo liderando a alta (48%), seguido por Minas Gerais (38%), segundo levantamento do Ministério da Justiça. Outro problema é que o número de homicídios intencionais, apesar de estar em queda, tem redução bastante lenta: no ano ado, foram 35 089 assassinatos no país, o que dá uma taxa de 16,51 mortes a cada 100 000 habitantes — comparável à de países como Iraque, Costa Rica e Guatemala e bem longe da ostentada por nações como Alemanha (0,3), Reino Unido (1,2) e Estados Unidos (5,3). Sem contar que a aposta no confronto não foi capaz de frear o brutal avanço das facções armadas do crime organizado pelo território nacional.

A combinação de uma força policial nas ruas orientada por informações fornecidas pelas novas tecnologias tem sido uma constante em grandes metrópoles mundiais, como é o caso de Nova York. A megalópole americana foi uma entre as quais a prefeitura de São Paulo usou como inspiração. Infelizmente, devido a erros pontuais e a um tipo de oposição ideológica, baseada no argumento dos limites de privacidade, algumas cidades recuaram nos investimentos. É o caso de São Francisco, na Califórnia, que proibiu o uso de câmeras de reconhecimento por forças policiais. O motivo foi uma série de erros recorrentes na identificação, sobretudo, de mulheres e negros. Em Sergipe, o governo suspendeu o uso do sistema no ano ado, após dois inocentes terem sido detidos quando a imagem apontou uma correspondência errada com os verdadeiros criminosos. Em São Paulo, antes do início do Smart Sampa, entidades foram à Justiça para barrar a compra das câmeras inteligentes, alegando que a tecnologia poderia prejudicar, principalmente, a população preta e parda. “A gente teve que brigar muito e sofreu muita ação judicial. Mas fomos demonstrando que as alegações eram inverídicas”, diz Ricardo Nunes. A prefeitura trabalha com um nível de precisão de 90% e afirma que ainda não houve “falso positivo”, ou seja, nenhum dos abordados era a pessoa errada.

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TÁTICA - PMs em SP: só o uso da força não resolve o problema da criminalidade
TÁTICA - PMs em SP: só o uso da força não resolve o problema da criminalidade (Paulo Pinto/Agência Brasil)

Apesar de concordarem que o monitoramento pode trazer resultados positivos contra a criminalidade, especialistas apontam que ela deve ser aplicada com cuidados, sobretudo no que diz respeito à segurança dos dados. “O poder público precisa estar em concordância com a LGPD, a Lei Geral de Proteção de Dados”, diz o delegado André Pereira, presidente da Adpesp (Associação dos Delegados de Polícia de São Paulo). Para Daniel Edler, do Núcleo de Estudos da Violência da Universidade de São Paulo (NEV-USP), a preocupação também a pela análise correta de onde o sistema tem tido êxito. “A tecnologia envolve ganhos para a segurança pública, principalmente no compartilhamento de informação entre as polícias, mas há que se ter o cuidado com a avaliação dos números e transparência com a destinação das imagens coletadas”, diz.

São preocupações pertinentes, mas que não eliminam o fato de que a ampliação do uso da inteligência é, sem dúvida, um o à frente no combate à criminalidade. Ajustes certamente precisarão ser feitos, até porque a própria tecnologia avança a cada dia. Espelhar-se nas iniciativas bem-sucedidas parece ser um bom primeiro o para qualificar esse debate e, como consequência, obter avanços significativos na luta contra o crime. A população, acuada, agradece.

Publicado em VEJA de 24 de janeiro de 2025, edição nº 2928

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